Eis uma experiência relatada em primeira mão pela blogger/instagrammer Allison Kimmey, promotora do movimento body positivity.
“Enquanto estava a limpar a bancada da cozinha, abri a tampa do lixo e vi algo lá que me chamou a atenção: ali estava a barbie da minha filha, no meio de uma pilha de lixo. Mas não era qualquer barbie. Era a sua única barbie curvilínea. Vocês sabem – a versão ligeiramente mais larga da barbie que a marca criou na tentativa de promover a inclusão.
M: “Cambelle!” – chamei-a
C: “O que foi mãe?” – perguntou ela enquanto passeava pela cozinha, segurando uma das suas outras barbies
M: “Deitaste fora esta barbie?”
C: “Ummmmmm. Sim.” – respondeu ela, sabendo que provavelmente não era a coisa correta a fazer.
M:”Okayyyy. Podes explicar-me porque deitaste fora um dos teus perfeitamente bons brinquedos?”
C: “Porque não gosto dela”
M: “Em que sentido não gostas dela?”
C: “Os braços dela não estão bem, as pernas não estão bem. Ela não se parece como as minhas outras barbies. E ela não cabe em nenhuma roupa excepto este outfit”.
Eu pausei. Estava sem palavras. Honestamente senti lágrimas a começaram a escorrer dos meus olhos. Estava a identificar-me com este objeto inanimado. Foi como se a vida desta Barbie fosse uma reflexão da forma como eu me senti durante TANTO tempo ao ser uma mulher plus size num mundo de mulheres magras.
Eu sempre senti que as minhas pernas não estavam bem, nem os braços. E que eu, como um todo, e fosse onde fosse, nunca me encaixava. Durante tanto tempo permiti que estas percepções e constrangimentos da sociedade me fizessem sentir como lixo.
A barbie curvilínea ainda vive num mundo de barbies magras. Lançar uma barbie com mais curvas não resolve, de um dia para o outro, a nossa gordofobia nem abre espaço para a aceitação de todos os tipos de corpos.
Tal como haver opções de vestuário maiores não altera, de um dia para o outro, a percepção das mulheres que vestem acima de um 40.
M: “Como achas que a barbie se sentiu quando a puseste no lixo? Achas que foi uma coisa simpática a fazer?”
C: “Eu acho que ela se sente triste e quer chorar”
M: “Só porque o corpo dela é diferente do das outras barbies, significa que ela é errada?”
C: “Não, mãe. Porque ela tem mais gordura. E é OK ter mais gordura”.
M: “E só porque as roupas dela não lhe servem tão bem, isso significa que ela não tem direito a brincar com as outras barbies?”
C: “Não, mãe. Temos de ser gentis para todos.”
M: “Tens amigas que são diferentes de ti?”
C: “Sim, mãe. Algumas têm pernas magras e outras meninas como eu têm pernas que se tocam”.
M: “Okay, vamos deixar essa conversa para outra altura. Achas que podes lavar a barbie e encontrar algo para ela vestir? ”
C: “Sim, mãe.”
Phewwww! Para ser honesta, não estava preparada para ter esta conversa naquele momento. Nunca estive. Mas de cada vez que surge uma situação assim, eu posso ignorar estes sinais precoces de problemas de autoimagem e deixá-los passar, ou posso fazer um esforço conciente de a ajudar a dissecar como ela se sente, permitindo-a explicar o seu disconforto, e oferecendo-lhe uma nova perspetiva para ela refletir.
Eu percebo. É mais fácil ignorar. Mas ser pai/mãe não é fácil. E se queremos educar a próxima geração para a inclusão corporal, autoestima, autoamor, então isso COMEÇA EM CASA! Começa connosco, pais, a nos perguntar: “estou a ser um bom exemplo que quero que os meus filhos sigam?”. Estou consciente das coisas que a minha filha vê diariamente? Estou a tirar o tempo suficiente para lhe explicar o que ela vê e o que isso significa, para que tenha uma compreensão total sobre o seu próprio corpo e o dos outros?
Deitar fora a barbie porque esta não se encaixava com as restantes, é um sinal de que ela está a aprender a rejeitar o que é diferente e a aprender a associar o ser-se maior com o ser-se pior ou menos merecedor. E a verdade é que todos temos tamanhos diferentes ao longo das nossas vidas. As mudanças corporais ao longo da vida são inevitáveis. Há uma mensagem muito forte a ser passada pelos mídia, de que devemos estar sempre iguais todo o tempo e que há uma forma certa de se parecer (magra) – é um tempo crítico para ter uma voz mais alta no sentido de nos certificarmos que as nossas crianças sabem que ser diferente é OK, que os nossos corpos mudam ao longo da vida, e que é tudo parte do processo de vida.
Espero que estes bocados de conversa que vou tendo com os meus filhos e que vou partilhando, sejam um exemplo de como fatores externos têm influência em crianças em idade muito precoce. Mesmo em atividades tão simples e inofensivas como brincar com barbies, as crianças começam a desenvolver crenças sobre elas e sobre os outros. A melhor e mais importante coisa que podemos fazer é estar atentos e fornecer um ambiente positivo e educativo para que as nossas crianças explorem o que é ser humano e compreendam as diferenças únicas que todos temos, de forma a desenvolverem empatia, compaixão e aceitação”.
A lição deixada pela Allison é inspiradora e de extrema importância. É de pequeno que começamos a desenvolver crenças que nos são impostas, e uma delas é, infelizmente, que aquilo que é diferente ou que não encaixa deve ir, literalmente, para o lixo. Intervir nesta idade, no sentido de ensinar tolerância, aceitação, empatia, é fundamental para construírmos uma sociedade futura baseada cada vez mais nestes valores, ao invés do preconceito em geral, e da gordofobia em particular.
Que haja mais mães com este espírito! 👏👏👏
Não conhecia esta história e nem tenho palavras… É tanta verdade junta que nem sei o que dizer! A realidade é mesmo essa, as mulheres plus size não têm muitas opções e tendo em conta o que lhes é oferecido pelo mercado a frustração é inevitável. Ou seja, primeiro é preciso mudar a indústria e só depois então se conseguirá mudar a mente (e autoestima) das pessoas.
Uau, que relato!
Adorei este artigo e vou ter de o partilhar no meu blog.
Fiquei com a lágrima no canto do olho pois eu também tenho excesso de peso e muitas vezes “não me encaixo” e isso deixa-me muito muito triste.
O relato da Allison está lindo e deixou-me com um sorriso de orelha a orelha porque se todos os pais educassem os filhos assim, este mundo não estava perdido como está. Infelizmente o preconceito ainda reina.
Beijinhos,
Melissa Sousa | Fábrica de Temperos
A MINHA VIAGEM DE SONHO – TURQUIA